No transcorrer do trabalho científico, frequentemente nos deparamos com situações inesperadas. Uma delas aconteceu justamente quando abordávamos a questão do diálogo. Não esperávamos que esse tema pudesse suscitar tanto interesse. Ou teria sido cochilo nosso? Em uma época em que todos acham que têm direito a falar o que bem entendem, e de fato colocam esse direito em prática, quem tem ouvidos para o outro? Em outras palavras: ainda há espaço para o diálogo?
O distinto leitor que já leu o aforismo sobre sábios e vendedores falando, deve se lembrar de um lado, dos vendedores que falavam mais que a boca; de outro, sábios que simplesmente não abriram a boca. Mas, insatisfeitos com as respostas obtidas (nenhuma, como você, leitor, deve se lembrar) decidimos repetir a mesma pesquisa com o mesmo público alvo (vendedores e sábios), tomando apenas o cuidado de não repetir os mesmos indivíduos.
No caso dos vendedores, não interessava se eles vendessem quebra-queixo na entrada de estádio de futebol; tapete persa para colecionador rico e entendiado; arma no mercado negro para super-herói de milícia de periferia; ou carro com motor barulhento para que o filhinho de papai mostre para as gatinhas quão possante e potente é ele.
Do mesmo modo, escolhemos, para essa rodada de pesquisa, sábios de diversas latitudes e inclinações filosóficas e religiosas: sábios com roupas esvoaçantes e coloridas, unhas e barba de diferentes comprimentos – não achamos que unhas sujas e compridas nem que barba cheia de piolhos poderiam comprometer o resultado das pesquisas; e sábios de terno de corte impecável, cabelo engomado sem um fio sequer fora do lugar e unhas pintadas com base, cada um com pelo menos três celulares.
A pergunta foi a mesma: “vocês acham que o homem é o que fala”? Colocamos todos juntos, na mesma sala. Bem, prezado leitor, pretendíamos, com a mais sincera honestidade, apenas saber o que vendedores e sábios pensavam sobre o tema, não presenciar um surpreendente e inesperado foguetório verbal em que todos falavam ao mesmo tempo.
(Se quiser nos ajudar, podemos enviar o arquivo para você fazer a transcrição da conversa. Se você conseguir entender uma única palavra, agradecemos.)
Reprodução permitida, desde que citada a fonte. Caso contrário vamos soltar os cachorros em cima do infrator. ;-)
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