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Democracia onde falta pão, todos gritam e ninguém tem razão

Viver em sociedade é uma complicação. Muitas sociedades, não suportando a carga que significa viver confrontando o tempo inteiro, acabam por preferir um caminho mais curto, que elas consideram mais seguro: nesse caso, um grupinho diz o que pode e o que não pode ser feito, e, quando este último acontece, é cassetada no lombo e um tempão fora de circulação vendo o sol nascer quadrado. Não raro, se as duas últimas medidas não surtirem o efeito desejado, a manutenção da ordem exige que o elemento que teima em discordar do que concordam todos aqueles que não querem apanhar, seja tirado de circulação de uma vez por todas e não venha incomodar a santa paz nunca mais.

Nossos pesquisadores queriam entender uma questão: de um lado, uma sociedade ordenada, feito uma sequência de postes, um atrás do outro, um como o outro, mudo um como mudo o outro; de outro, uma sociedade de bocas, uma diferente da outra, nenhuma como a outra, uma falando diferente da outra. No primeiro caso, um silêncio que é o mesmo dos cemitérios; no segundo, um vozerio de feira livre, de estádio de futebol.

Nossos pesquisadores constataram que no primeiro caso costuma ter muito para uns poucos autoescolhidos e pouco para muitos, e se reclamar, nem isso. Como reclamar não pode, o que tem é o que a casa oferece. No segundo caso também costuma ter muito para uns poucos, mas os muitos podem ao menos se beneficiar eventualmente de sobras do banquete. Mas, pensaram nossos pesquisadores, e enquanto as sobras não vêm? Eles constataram que a gritaria é grande, beirando o insuportável. Quanto mais apertado o estômago, mais alta a reclamação. Ao contrário da sociedade dos postes, reclamar ao menos podia, mesmo que não houvesse certeza de que, reclamando, a fome acabaria.

Nossos pesquisadores constataram também que se o equilíbrio da sociedade dos postes estava garantido de antemão e à base de cacetadas, era bem difícil harmonizar vozes dissionantes, tanto mais se desafinadas pela fome.

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