Nossos pesquisadores não são exatamente especialistas em etiqueta, por isso, eles acharam melhor não se posicionar se é má educação abrir a boca com um pedaço de moela dentro dela, nem se é conveniente participar de uma reunião com o chefe depois do almoço de quarta-feira, com a feijoada completa fazendo do estômago um campo de guerra, e um pedaço de couve mais que provável enfeitando o espaço entre o canino e o primeiro molar superior.
Para eles, seria mais prudente abordar a questão de um ponto de vista ampliado: por que reclamaria quem está se alimentando? Um primeiro grupo de respondentes não tinha a possibilidade de se alimentar convenientemente, muito menos cotidiamente. Nossos pesquisadores observaram que nenhum deles abria a boca para responder a pergunta: antes, devoravam a comida avidamente temendo não ter outra oportunidade. Nem agredecer agradeciam!
Um segundo grupo de respondentes apresentava perfil sócio-econômico completamente diferente do primeiro. Este grupo era constituído de gente bem, começando do fato de serem bem nascidos: fartamente alimentados, educados nas melhores escolas no Brasil e no exterior, ocupando por indicação os melhores empregos (mas sem terem propriamente tempo para trabalhar, tempo dedicado a ganhar dinheiro), filhos de filhos de filhos de filhos de filhos de filhos de filhos de gente que tem pelo Brasil o apreço que a casa grande tem pela senzala. Nossos pesquisadores partiram do pressuposto de que tal finesse só poderia inevitavelmente se refletir em uma etiqueta acima de qualquer suspeita, à altura das mesas mais finas e elegantes. Nada de palitar os dentes; nada de arrotar na mesa, mesmo com a mão em frente da boca; nada de comer como comem aqueles que se empanturram, por não saber quando poderão comer novamente; nada de limpar a boca com a mão.
Surprendeu nossos pesquisadores, no entanto, um comportamento inesperado: mesmo alimentados, esse grupo não parava de reclamar; mesmo contando com as mais finas iguarias, não paravam de reclamar; mesmo não tendo tido o menor trabalho para preparar a comida que comiam, não paravam de reclamar; mesmo não tendo pago pela comida que comiam, não paravam de reclamar; mesmo não tendo gasto um único centavo preparando o fino ambiente em que comiam, com guardanapo de linho, talheres pesados e prataria de primeira, não paravam de reclamar.
Nossos pesquisadores estão intrigados: algum dia essa gente irá deixar de falar de boca cheia?
Reprodução permitida, desde que citada a fonte. Caso contrário vamos soltar os cachorros em cima do infrator. ;-)
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