Quando começaram a trabalhar com esse aforismo, nossos pesquisadores suspeitaram tratar-se de um lobby de psicólogos, psiquiatras, terapeutas holísticos argentinos sediados na Califórnia e amalucados em geral. Eles pensaram o seguinte: diante da total quebradeira dos valores dos últimos tempos, o ser humano, que anda mais perdido que cachorro em dia de mudança, não confia mais em nada: da religião à família; da pátria ao time de futebol; da política à sexualidade; da sociedade aos amigos da biriba – tudo pode deixar de ser o que sempre foi e passar a ser uma nova coisa que sabe-se lá o que poderia vir a ser! O terreno seguro onde pisava foi substituído por uma corda bamba. O futuro, antes risonho, dá lugar a uma carranca mais feia do que aquelas dos barcos que navegam no rio São Francisco.
Sentindo-se confuso e desnorteado, o homem não sabe se ri ou se chora; se acende uma vela para Deus ou se chama urubu de meu louro; se leva a sério a vontade de pintar a unha e fazer depilação definitiva da barba; se abandona o namorado por uma namorada mais interessante e carinhosa; se corre ou se deixa o bicho pegar; se late para economizar no cachorro.
Para piorar, nossos pesquisadores constataram que o que existe no fundo desses questionamentos é uma dúvida sobre a última palavra das coisas. Em caso de dúvida sobre religião, antes perguntava-se ao padre, ao rabino, ao pastor, ao pai-de-santo; em caso de dúvida sobre família, perguntava-se a pai e mãe; em caso de política, perguntava-se a um vereador, deputado, senador. Dependia-se de quem achávamos que teria o que nos responder. Mas esse tempo acabou. Restava o que restou: nós, e cada um de nós por si mesmo.
Então, se as pessoas não devem confiar nas outras, porque, afinal, ninguém é mais confiável, a quem restaria pedir auxílio para os males da alma, da existência, das finanças, da sexualidade, do time de futebol, do amor, do relacionamento? Das duas, uma: ou perguntam a eles, psicólogos, psiquiatras e terapeutas holísticos argentinos (o que confirmaria nossa tese de lobby) ou perguntam a si mesmas. Mas, perguntar a si mesmo não seria perguntar a uma pessoa tão humana quanto o padre, o rabino, o pastor, o pai-de-santo, o pai, a mãe, o vereador, o deputado, o senador?
Essa a dúvida: o que seria pior?
Reprodução permitida, desde que citada a fonte. Caso contrário vamos soltar os cachorros em cima do infrator. ;-)
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