Não é de hoje que a humanidade discute como tudo começou, se com o verbo, se com a ação. Para tentar deslindar os sentidos deste aforismo, nossos pesquisadores descartaram logo de início qualquer conotação religiosa. Antes, eles estavam interessados em entender algo de muito mais terreno: por que o homem prefere esquecer que a raça à qual pertence, a humana, deve parte de sua classificação ao fato de ter mãos, e que elas se desenvolveram para uma míriade de atividades, e que mesmo contando com essa ferramenta de notável utilidade, ele prefere usar muito mais aquele órgão do qual o mal não para de sair.
Nossos pesquisadores não demoraram nem um pouquinho para encontrar pessoas dispostas a falar sobre o tema. Todos eles invariavelmente tinham uma opinião sobre o assunto: para uns, o homem não é dado a usar as mãos por uma questão de cálculo: se desse menos trabalho trabalhar, ele até trabalharia; como não dá, não trabalha. Para outros, tudo começou com os ricos, gente que nunca precisou colocar a mão na massa para ganhar a vida – esses, a única atividade que fazem com as mãos é colocar a mão no resultado do trabalho alheio. Sobre os ricos, tivemos outra resposta interessante: trabalhar dá calo nas mãos, o que é feio, além do mais, precisar trabalhar para viver é uma coisa muito deselegante. Outra então: quem precisa trabalhar para ganhar a vida é porque não a merece.
Para outros respondentes, a política herdou diretamente dos ricos a concepção de trabalho daqueles: os outros que trabalhem! Um numeroso grupo respondeu que também não deve ser ruim a vida de um profissional da psicologia: gente que fala e fala (sobretudo que o paciente não pode deixar de vir a próxima sessão), tentando dar jeito na vida dos outros (enquanto a dele está uma catástrofe), e ainda recebe por isso. Dos sábios, então, disseram muitos respondentes, não há o que falar, já que eles falam por todo mundo.
Nossos pesquisadores estão especulando se o enorme desenvolvimento da robótica, cujo trabalho substitui o trabalho das mãos humanas com um nível de eficiência incomparável, não seria resultado de um profundo desconforto do homem com sua condição, contra a qual ele não encontrou melhor maneira de se rebelar do que inventando um processo que, de uma vez por todas, fará com que ele entregue sua vida nas mãos de outrem, enquanto ele continua falando pelos cotovelos.
Reprodução permitida, desde que citada a fonte. Caso contrário vamos soltar os cachorros em cima do infrator. ;-)
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